O tributarista Leonardo Manzan aponta que uma das discussões mais relevantes no contexto da reforma tributária diz respeito à definição da base de cálculo dos novos tributos, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). A escolha entre receita bruta, receita líquida ou faturamento como referência para a apuração do imposto tem implicações diretas na carga tributária efetiva das empresas.
Embora a proposta de simplificação vise eliminar distorções e garantir neutralidade econômica, o detalhamento sobre o que será considerado como base tributável ainda depende de regulamentação complementar. Essa indefinição afeta o planejamento das empresas e gera expectativa em setores onde há grande diferença entre faturamento e receita líquida, como serviços e tecnologia.
Faturamento ou receita? Entenda a diferença prática
Faturamento, em termos gerais, representa o total das vendas realizadas em determinado período, sem considerar descontos, devoluções ou abatimentos. Já a receita líquida é obtida após essas deduções, refletindo mais precisamente o que foi efetivamente recebido pela empresa. Em setores com alta incidência de abatimentos, a diferença pode ser expressiva.
Conforme explica Leonardo Manzan, a definição da base de cálculo tem impacto não apenas no valor a ser recolhido, mas também na estratégia comercial da empresa. Se a legislação optar pelo faturamento como base, empresas que concedem prazos longos, operam com grandes volumes ou praticam descontos agressivos serão proporcionalmente mais oneradas, comprometendo sua margem.
A escolha da base e o princípio da capacidade contributiva
Um dos fundamentos do sistema tributário brasileiro é o princípio da capacidade contributiva, que busca assegurar que a tributação ocorra conforme a real aptidão econômica do contribuinte. Sob esse ponto de vista, a receita líquida parece ser uma base mais justa e proporcional.
Segundo Leonardo Manzan, o legislador terá o desafio de equilibrar eficiência arrecadatória com justiça fiscal. A adoção de uma base ampla e bruta pode facilitar a fiscalização, mas ignora nuances econômicas fundamentais. Por outro lado, uma base líquida exige critérios técnicos mais refinados e maior segurança jurídica para evitar autuações abusivas.

Impactos setoriais: quem ganha e quem perde
Setores com margens menores e maior volume de devoluções, como o varejo, tendem a ser penalizados se a base de cálculo for o faturamento bruto. Já segmentos com alta previsibilidade e baixa variação entre emissão e recebimento de receitas poderão ser menos impactados. O setor de serviços, especialmente, aguarda com atenção o desfecho dessa definição.
Leonardo Manzan elucida que a definição da base tributável pode alterar completamente a viabilidade de modelos de negócio baseados em assinaturas, licenciamento ou pagamento por uso. Empresas de tecnologia e plataformas digitais também podem ser afetadas, já que muitas operam com valores retidos por terceiros ou taxas de intermediação.
A importância do planejamento fiscal preventivo no novo cenário
Independentemente da base escolhida, as empresas devem revisar suas estruturas fiscais e operacionais. A clareza sobre a composição da receita, o controle dos descontos e devoluções e a documentação contábil serão essenciais para garantir a correta apuração dos tributos e evitar riscos de autuação.
De acordo com Leonardo Manzan, o planejamento tributário deve antecipar possíveis cenários e projetar o impacto de cada um sobre o caixa, a margem e a precificação. Mais do que nunca, será fundamental que os setores jurídico, contábil e financeiro atuem de forma integrada e técnica, utilizando simulações para orientar decisões estratégicas.
Receita, faturamento e transparência: o que as empresas devem cobrar do legislador
Em meio à transição para o novo sistema, a definição clara e precisa da base de cálculo deve ser uma prioridade para o legislador. Ambiguidade nesse ponto pode comprometer toda a lógica de simplificação e racionalização prometida pela reforma. Além disso, a ausência de padronização nacional pode gerar disputas entre os entes federativos e aumentar o contencioso.
Leonardo Manzan frisa que a transparência na construção das normas será essencial para garantir segurança jurídica às empresas e estabilidade ao novo modelo. A escolha entre receita e faturamento não é apenas técnica, é estratégica. O Brasil precisa de uma base tributária justa, clara e equilibrada, que permita o crescimento econômico com responsabilidade fiscal.
Autor: Laimyra Isarrel